Dados são do boletim da Rede de Observatórios da Segurança Além da Floresta
A Bahia, entre 2017 e 2022, registrou 428 vítimas de crimes socioambientais, sendo ameaças representaram mais da metade dos casos, seguidas por lesões corporais e injúrias, e as principais vítimas foram mulheres. Os dados são do novo boletim da Rede de Observatórios da Segurança Além da Floresta divulgados nesta segunda-feira (19).
O levantamento aponta que este tipo de crime se concentra em seis cidades do estado baiano, incluindo Porto Seguro, Salvador, Banzaê, Pau Brasil, Ilhéus e Itaju do Colônia, sendo que as últimas quatro estão localizadas no Sul Baiano, conhecido por seu turismo. Com destaque para o município de Banzaê, no extremo norte do estado, próximo à divisa com Sergipe. Onde o povo Kiriri luta pela demarcação de seu território e enfrenta conflitos com grileiros e fazendeiros locais. Recentemente, o município criou a primeira Secretaria dos Povos e Comunidades Tradicionais da Bahia.
O objetivo do estudo é mostrar que a tradicional divisão entre violência urbana e rural já não é mais suficiente para entender essa realidade.Já que, de acordo com o levantamento, nos últimos anos, observou-se uma configuração complexa de faccionalização das periferias rurais, incluindo quilombos e aldeias indígenas. Essa nova dinâmica ocorre especialmente em estados do Norte e Nordeste, locais onde as populações expulsas de áreas rurais migram para pequenas cidades próximas, formando as chamadas “periferias rurais”. Além disso, regiões da floresta amazônica agora são dominadas por facções criminosas famosas no Sudeste, como o Comando Vermelho (CV) e o Primeiro Comando da Capital (PCC), potencializando desde microcriminalidades até disputas territoriais com violência.
Os dados são baseados no monitoramento feito pela rede Rede de Observatórios em relação aos crimes socioambientais, traçando informações sobre violações contra populações tradicionais, como indígenas e quilombolas, e crimes como grilagem de terras, exploração ilegal de madeira e garimpo em áreas não autorizadas e revelam que diferentes estados têm entendimentos e classificações divergentes sobre esse tipo de crime.
A pesquisa destaca ainda a existência de diversos tipos de crimes socioambientais, como extração ilegal de minérios, ocupação de terras, desmatamento, pesca ilegal, tráfico de aves, maus tratos a animais, pichação e soltura de balões. Além disso, evidencia que as informações fornecidas pelas autoridades de segurança podem encobrir camadas complexas quando empreendimentos legais expulsam populações de seus territórios, criando um ambiente propício para a atuação de facções criminosas.
Racismo estrutural
A pesquisa expõe a influência do racismo estrutural e do encarceramento da juventude negra no atual modelo de segurança pública, baseado na guerra às drogas. Para a coordenadora da Rede de Observatórios da Segurança, Silvia Ramos,é necessário “fugir do modelo bélico do combate às drogas e às ilegalidades. E, principalmente, estabelecer contenções ao tipo de desenvolvimento que destrói a vida na floresta. Mostra-se importante fortalecer os órgãos de prevenção da destruição e incluir no centro do diálogo organizações indígenas, rurais e ribeirinhas, além dos movimentos de periferia urbanos que lutam por direitos sociais”, afirma.
“Esses mercados se sustentam no racismo, explorando mão de obra barata de pessoas que podem ser presas ou mortas sem gerar comoção pública. Quem controla esses mercados não suja as mãos com barro, mercúrio, cocaína, pólvora e sangue. Portanto, a solução está em tratar os conflitos e as violências menos como um problema de segurança pública e justiça penal, e mais como uma questão social, racial, econômica e política”, ressalta o pesquisador da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), Fabio Candotti.
Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil